Em busca da paz
(Vanderlei
Oliveira)
Quando
comecei ouvir o termo “erro
médico”, ainda na minha
tenra idade, eu não me dei
conta do que isso realmente significava.
Para mim esse termo dizia respeito
ao médico que, com excesso
de serviço e com poucas condições
de trabalho, falhava e não
conseguia salvar um paciente, sentindo-se
mal e lamentando-se ao dar a triste
notícia aos familiares. Significava
para mim que o paciente - muitas vezes
vindo de regiões pobres e numa
emergência - acabava tendo reações
alérgicas à anestesia,
como aconteceu com um amigo na minha
infância. Resumindo: o erro
médico, na minha inocente concepção,
era causado por fatores externos,
jamais pela imperícia e descuido
de um profissional tão especializado,
que estudou muitos anos para exercer
uma tão nobre função
perante a sociedade.
Mas eu cresci. E crescendo fui descobrindo
que muito mais que a nobreza da profissão,
em muitos casos existe a correria
louca atrás do dinheiro, do
status, do bom nível social
e somente isso.
Quando se lê em alguns jornais
que um médico exige ganhar
15 mil reais por mês para cuidar
de pessoas pobres em cidades pequenas
do interior do país, quando
se lê que o que o governo só
pode pagar a “mísera”
quantia de 8 mil reais, com direito
à casa e carro, certamente
concluo que algo está muito
errado. Nessa hora o juramento feito
na ocasião de sua formatura
é esquecido, torna-se mera
retórica, apenas uma tradição
a ser seguida, fotografada e filmada
e não vai além disso.
Perdi um amigo na minha infância
por erro médico; perdi outro
amigo na minha adolescência
por erro médico; há
menos de um ano um amigo – mecânico
de automóveis – ficou
paraplégico por conta de um
grosseiro erro médico. Tomei
conhecimento através de minha
amiga Chafiha que seu filho foi assassinado
por uma seqüência horrenda
de erros primários de um profissional
que jamais poderia ter tal título,
já que agiu com descaso e arrogância,
algo que uma pessoa que lida com vidas
humanas jamais deveria fazer.
Hoje, ligo a televisão e num
programa qualquer, um filho reclama
que esqueceram 50 centímetros
de gaze dentro de sua mãe.
Um outro homem, usando prótese
no lugar da perna, afirma com documentos
em mãos, que médicos
de um hospital público deixaram
sua perna apodrecendo, sequer fazendo
limpeza no ferimento após ele
ter sido internado por causa de um
pequeno acidente de moto.
Mês passado, uma amiga foi se
preparar para uma cirurgia no útero,
de onde retiraria material para uma
biópsia. Na conversa com o
“médico”, apenas
uma semana antes da operação,
ela foi maltratada e suas questões
ignoradas, como se ela não
fosse a pessoa mais interessada no
que aconteceria dali a poucos dias.
Por quê isso? Serão eles
os donos da verdade? Será que
a nobreza da profissão os faz
melhores e superiores às demais
criaturas de Deus? Ou será
que é por causa do poder que
o corporativismo da sua classe lhes
outorga? Ou será que a arrogância
é o que lhes dá motivação?
Onde estão meus heróis?
Onde estão o Dr. Kildare, Dr.
Richard Kimble (O Fugitivo) e Dr.
Ross e Dr. Greene (Plantão
Médico). Será que são
mesmo pura ficção? Por
que será que tão poucos
se inspiraram neles para exercer sua
profissão?
Nos meus 35 anos de idade vejo a meia
idade chegando e conseqüentemente
o aumento da freqüência
das minhas visitas aos médicos.
E vejo isso, infelizmente, sem otimismo
algum. Deixo nas mãos de Deus
a minha vida e sigo o destino que
Ele me traçou. Que todos nós
consigamos passar por tudo isso vivos
e, a despeito dos medos e preocupações
inerentes, possamos ter paz...
(Vanderlei Oliveira)